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4/14/2019

Abrigo de animais da USP é cercado por contradições

Que mistério doido é este?
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Estado real do canil é incerto; entrada no local depende da autorização de uma só pessoa

“Abrigo na USP? Prefiro não falar do assunto”; “vocês vão precisar de uma autorização para fazer esta entrevista”. É raro encontrar estudante ou funcionário da Universidade de São Paulo que esteja disposto a conversar sobre ou
tenha colocado os pés no Abrigo Temporário de Animais do Campus Butantã. Na tentativa de entender a situação atual do espaço, nos deparamos com empecilhos burocráticos e relatos contraditórios.

Criado em 2001 pelo USP Convive – programa que planejava facilitar a convivência entre humanos e animais –, o abrigo nasceu com o objetivo de recolher cães e gatos que estivessem doentes ou causando problemas à comunidade uspiana. A fim de reunir recursos para o local, membros do projeto deram origem à ONG Patinhas Online.

Entre 2013 e 2014, porém, o abrigo e 82 dos 116 cães alojados passaram por uma avaliação sanitária de pesquisadores da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ-USP), autorizados pela Prefeitura do Campus da Capital (PUSP-C), órgão responsável pela gestão do espaço em parceria com os Patinhas Online desde 2004, data do fim do projeto USP Convive.

Os resultados da avaliação saltaram aos olhos: acúmulo de alimento em recipientes abertos, sinais da presença de roedores na sede da administração e nas baias dos cães, falta de manutenção da rede hidráulica e poda de árvores, superlotação de animais, déficit de funcionários, condições precárias de higiene. Não havia registro de entrada ou saída dos cães, a alimentação era oferecida sem critérios e os medicamentos, aplicados pelos próprios funcionários.

Tese denunciou situação

O estudo fez parte do Programa de Monitoramento Animal do Campus (ProMAC), compromisso firmado entre a instituição e a Prefeitura do Campus, sob a direção do professor da FMVZ Ricardo Augusto Dias. “As condições observadas permitiam a responsabilização criminal dos responsáveis pela estrutura, sob acusação de maus-tratos”, denunciou a tese de doutorado de Aline Gil Alves, uma das integrantes do ProMAC.

A Prefeitura do Campus recebeu relatório dos pesquisadores da FMVZ com recomendações para o abrigo, desde a adequação da estrutura e dos processos de manejo dos animais à proteção da saúde dos funcionários. As recomendações, porém, não tiveram respostas do então prefeito, Arlindo Philippi Jr, e o estudo permaneceu esquecido.

Na falta de um retorno oficial, os pesquisadores foram hostilizados pelos funcionários da Prefeitura, como também denuncia a tese de Aline. Um dos funcionários abriu uma sindicância contra Ricardo Dias, acusando-o de maus-tratos contra os animais durante os atendimentos ao abrigo. A queixa era falsa: o professor participou das reuniões das comissões de sindicância, foi absolvido e recebeu pedidos de desculpa formais por parte da Reitoria. “Esta situação fez com que eu nunca mais trabalhasse com cães e muito menos com cuidadores de animais”, revelou.

USP desconhece abrigo

Ao longo do tempo, o abrigo de animais da USP ocupou diferentes espaços no Campus. Para não incentivar o abandono de cães e gatos, como alertou a funcionária do Serviço de Saúde Ambiental da PUSP-C, Daniella Vilela, não citaremos o endereço atual do local.

Durante a apuração, a reportagem do JC fez quatro tentativas de entrar no abrigo. Em todas elas, não encontramos a cuidadora dos animais, Elisabeth Raboczkay, a única pessoa que possuía as chaves para abrir o local. Por e-mail, ela informou: “quando não me encontram, é porque estou no veterinário, ou na farmácia, ou no campus”.

Segundo ela, “mais ou menos 57 cães e 9 gatos” vivem no espaço atualmente. Desde 2013, quando o grupo de pesquisadores da FMVZ avaliou o local, o número de cães, considerando esses dados, foi reduzido pela metade.

O alojamento parou de recolher animais há mais de três anos e, ainda assim, permanece ocupando sua capacidade máxima – cerca de 50 cães, segundo Daniella Vilela –, o que revela, no mínimo, que os procedimentos de adoção têm sido lentos.

Apesar da lotação do abrigo, órgãos da USP ainda tentam se servir do espaço. No início de março deste ano, como noticiado pela última edição do JC, a Superintendência de Assistência Social (SAS) solicitou o encaminhamento de um cão comunitário do Conjunto Residencial da USP para o alojamento. O fato chegou à pesquisadora da FMVZ Aline Dias: “A própria Universidade não tem consciência institucional das condições em que se encontram o abrigo de animais do Campus”, denunciou.

Alojamento é uma incógnita

Responsável pela adoção e tratamento dos animais do abrigo, a ONG Patinhas Online não informa o endereço físico ou o telefone da organização em seu site ou página no Facebook. O site apresenta apenas 31 cães e 4 gatos disponíveis para adoção. De acordo com o número atual de animais do alojamento informado pela cuidadora, faltariam 26 cães e 5 gatos nessa lista de divulgação. Questionada, Elisabeth alegou que o endereço virtual encontra-se desatualizado.

Atualmente, informou a cuidadora do abrigo, a ONG Patinhas Online gasta de R$ 3 a 10 mil reais por mês com cuidados veterinários. À época do ProMAC, o Hospital Veterinário da FMVZ-USP atendia os cães do espaço, mas, explica o professor Ricardo Dias, os funcionários exigiam prioridade na assistência desses animais, ao mesmo tempo em que dificultavam o acesso das equipes ao alojamento, gerando frequentes atritos, responsáveis pelo fim da colaboração.

Segundo Daniella Vilela, a gestão do abrigo é a única responsabilidade da Prefeitura do Campus sobre o local, que não é fiscalizado pelo órgão. Gerir o espaço, explicou a funcionária da PUSP-C, significa bancar os custos de uma cuidadora, dois funcionários de limpeza terceirizados, ração e areia.

No último domingo de cada mês, os Patinhas Online realizam um mutirão, em que os voluntários levam os animais do alojamento para passear, tomar banho e atualizar vacinas. Uma estudante da FMVZ participou do evento, mas não teve acesso ao local. “Só me entregaram o cachorro e uma coleira para passear”, disse.

Até o fim desta edição, a cuidadora do abrigo não respondeu à solicitação para a reportagem entrar no abrigo. Procurada para responder questões acerca da estrutura do espaço e formação técnica dos funcionários, a Prefeitura do Campus solicitou ao JC o envio de um pedido via e-mail para avaliação da divulgação dos dados. Enviadas no dia 3 de abril, as perguntas não foram respondidas.

FONTE: jornaldocampus

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