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6/13/2019

Por que há humanos que abandonam seus pets?

O artigo é da jornalista Amelia Gonzalez e é muito interessante. Vale a pena ler suas reflexões.
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Numa tela do meu computador eu congelei a foto do Urso Panda que a China está emprestando para a Rússia para simbolizar uma boa amizade. Putin e Xi JInping posam para a foto fingindo que estão apreciando o bicho.


Um enorme urso, lindo, potente, forte, enjaulado num pequeno espaço aberto à apreciação. Vai ter que ser enjaulado num espaço ainda menor para a viagem de quase três mil quilômetros, que durará horas. Vai ter que ser anestesiado, possivelmente. E quando chegar numa terra estranha, o que será dele? Vai ganhar uma jaula um pouco maior? Um pouco menor? Ou vai ser abandonado como algumas crianças abandonam brinquedos que não gostam muito?

Se estão certos os cientistas que afirmam que os bichos sentem e pensam fico imaginando o pensamento daquele urso, enquanto serve de cenário para a foto que se espalha mundo afora como propaganda política. Tão fofos os dois, não?

Por coincidência, havia escolhido como tema para refletir aqui neste espaço hoje, justamente, a relação imbricada, delicada e muito conflituosa entre bichos e gente.

Na outra tela do meu computador, esperando minha leitura, tinha uma mensagem da Guarda Municipal do Rio de Janeiro, em resposta a um pedido meu. É que uma amiga me mandara uma mensagem que está pulando nas redes sociais – bem, isto foi antes do episódio Neymar – com a notícia de que os gatos estão morrendo a rodo no Parque do Flamengo e que os culpados pelo assassinato são os guardas municipais. Não são. Nem ronda a GM faz mais no local.

Leiam o que diz a nota:

“A Guarda Municipal do Rio informa que a notícia é um boato e esse texto circula nas redes sociais há mais de dois anos, pois encontramos a mesma postagem com data de maio de 2017. A Guarda Municipal não possui posto fixo no Aterro do Flamengo. Destacamos que após a implantação do programa Aterro Presente, o efetivo da GM-Rio que atuava no local foi deslocado para as áreas internas dos bairros do Flamengo, Glória e Laranjeiras. Hoje, o patrulhamento no local, que conta com a segurança de policiais do Aterro Presente, é feito diariamente por equipe do Grupamento de Guardas Motociclistas devido à extensão da área que requer maior mobilidade”.

Mas, como adoro o tema (bichos), busquei conversar com quem entende do assunto (gatos abandonados) para tentar enxergar alguma luz no fim do túnel dessa relação tão complexa com os humanos.

Regina Schummacher respondeu ao meu chamado, pelo telefone. Há 20 anos ela cuida dos gatos que vivem no Parque do Flamengo porque são abandonados ali pelos seus ex-donos. Não há atitude mais reprovável, sobretudo entre aqueles que adoram bichos, no qual me incluo. Se não pode mais ficar com o pet, arranje quem fique. E se não quer que se reproduza, se não se sente capaz de ser responsável pelos filhotes, ou de distribuí-los de forma segura, castre-o. Cachorros também, mas gatos merecem ainda mais este tipo de atenção pelo fato de fugirem com mais facilidade.

Bem, mas o assunto são os gatos já abandonados, e vamos voltar a eles.

Regina me conta que desde março deste ano está enfrentando um problemão: não tem mais o espaço que mantinha para cuidar dos bichos, lá no Parque, com seu Projeto Resgate de Animais. Com o próprio dinheiro, dela e de algumas voluntárias, ela está espalhando casinhas de gato para que eles se aninhem e comam. São cerca de 500 gatos. É muito bicho.

Pergunto o que, para ela, seria a solução para este enorme desafio:

“O poder público devia ter um castra móvel, sobretudo para entrar nas comunidades, ou mesmo fazer convênio com clínicas que possam castrá-los. É o jeito. Hoje eles fazem castração gratuita, mas só tem cinco vagas por mês. É muito pouco!", diz Regina Schummacher.
"A prefeitura, durante a administração de Cesar Maia, a nosso pedido criou um centro de castração ali no Largo do Machado, mas o Sr. Crivella (atual prefeito) fez o favor de acabar com ele. Com isto, nunca vi tantos animais nascendo e sendo abandonados. A situação está muito precária”.

Regina e suas parceiras vão fazendo o que podem, voluntariamente. E Regina lembra que o poder público também poderia fiscalizar os espaços para proibir as pessoas de jogar ali os bichinhos. Não seria difícil, porque existe até um ponto preferido pelos donos para o descarte, vamos chamar assim.

“As pessoas levam os bichos justamente para o sótão do Pavilhão Japonês porque fica longe dos carros, não tem perigo imediato de que eles fujam e sejam atropelados”, conta Regina.
Fiz contato com a Subsecretaria de Bem Estar Animal da prefeitura, que mantém a Fazenda Modelo, em Guaratiba, onde funciona o Centro de Proteção Animal. São 50 boxes onde ficam os animais vítimas de maus tratos ou abandonados. Quando recebem alta, são levados para serem adotados na campanha “Me beija, me adota” , que este sábado estará no shopping Uptown, na Barra da Tijuca.

Não é o suficiente, como vemos pela quantidade de gatos que há no Parque do Flamengo. O poder público deveria ter um olhar mais atento à questão, mas não anda conseguindo ter, nem mesmo, um olhar atento à questão dos humanos que não têm teto. E a pergunta é: por que tanta gente abandona os bichos?

Busquei a ajuda de Luc Ferry para fazer esta reflexão.

Ferry foi Ministro da Educação na França, é filósofo, humanista, escreveu vários livros, ganhou os prêmios Médicis e Jean-Jacques Rousseau de Ensaio. No seu livro “A nova ordem ecológica” ( Ed. Difel), que escreveu em 1992, mesmo ano da Conferência mundial que aconteceu aqui no Rio, ele conta a história real de alguns vilarejos no século XVI que combatiam percevejos e outros bichos que atacavam suas produções na Justiça. Sim, os insetos eram julgados e, não raro, ganhavam porque, no fim das contas, assim como os humanos, também precisavam sobreviver e aquela comida era essencial para eles.

O autor reflete além. E se pergunta se estamos vivendo hoje um “momento da verdade”, ou se é apenas um “novo imaginário que, por sua vez, fará sorrir as gerações futuras”.

“Pode bem acontecer, com efeito, que a separação do homem e da natureza, que conduziu o humanismo moderno a atribuir apenas ao primeiro a qualidade de pessoa moral e jurídica tenha sido apenas um parêntese, em vias de se reformar.”
Pensamentos que ajudam a fomentar nossa reflexão.

FONTE: G1 - Por Amelia Gonzalez

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